Let´s Go!

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10.5.12

Picasso, Moletom e Jim Carrey

O processo de perda de sensibilidade é normal em cidades grandes. Há tanta informação ao nosso redor que é impossível enxergar tudo, ou dar relevância a tudo. O mesmo vale para os meios digitais, e as pessoas olham para suas timelines no Facebook oferecendo segundos (ou menos) de atenção para as pessoas. Por isto que coisas que fogem do óbvio chamam a nossa atenção, e está cheio de criativo de agência tentando desesperadamente inventar algo que faça com que as pessoas prestem atenção na publicidade.


Tive uma conversa interessante com uma amiga sobre a dificuldade dela de fotografar coisas diferentes no cotidiano. Ela me dizia que consegue estruturar tecnicamente uma foto muito bem, mas não consegue ser "criativa". E a criatividade está associada à observação aliada à imaginação, já que a imaginação só funciona a partir de referências. Ninguém consegue imaginar algo totalmente diferente. Juntamos ideias e assim inventamos outras coisas.


A falta de observação e de imaginação afeta também o nosso universo mágico: Deixamos de ver poesia e mistério no que nos cerca (e dentro de nós consequentemente). Assim, não é de estranhar que estejamos cada vez mais criando relacionamentos a partir de trocas palpáveis, quer seja com outras pessoas, quer seja com deuses, religiões e também com os nossos desejos. A troca pragmática é palpável, está associada ao universo simbólico, mas é tangível. Dá para ver e tocar aquilo que foi trocado, quer seja beijo ou carro. Todos estamos submetidos às trocas palpáveis no cotidiano, mas elas não são as únicas que existem. As trocas simbólicas, impalpáveis, subjetivas, são fundamentais para a ordem mental e para a saúde do indivíduo como um todo. São aquelas que acabam compondo nosso arcabouço imagético, que permitem definir e redefinir o nosso "enxergar" no mundo, e que estimulam nossa criatividade.


Nesta mesma conversa estávamos falando do Jim Carrey, ator que gera amores e ódios, e me lembrei da imagem que ele postou no Facebook há pouco tempo atrás. A imagem, de uma calça de moletom numa loja qualquer, tinha o seguinte título: " Será que o Picasso passou por aqui?". Ela demonstra um "enxergar" na realidade diferenciado, embasado na experiência subjetiva simbólica e com base em referências visuais anteriores. Se ele não tivesse observado com atenção (Picasso e o Moletom), aquela associação nunca aconteceria. E a vivência mágica do mundo não ocorreria.


Saia para dar uma volta de vez em quando, vá olhar o mundo. Ele não é apenas uma paisagem disposta no seu trajeto, ele é parte de você.

9.5.12

Só se aprende fazendo (no caso, jogando)

Tá cheio de gente falando de Storytelling em comunicação e publicidade, e a maioria fala merda. Desconhecem os princípios arquetípicos, as estruturas narrativas, as bases neurais de construção de empatia, a semântica e a retórica. Acabam apelando inconscientemente para a contação de histórias da infância, e infantilizam a experiência que o Storytelling poderia gerar...
Existe um ditado em Holywood que diz que um bom roteiro pode gerar um filme ruim, mas nunca um roteiro ruim vai gerar um bom filme.


O que é curioso é que existem inúmeras boas histórias sendo contadas atualmente, mas parece que os desenvolvedores não conseguem sair do papel de "audiência" e analisar como desenvolvedores. Deve ser por isto que tem tanto publicitário que fica comprando revista para publicitário com campanhas já prontas para copiar. É só trocar o produto, "tropicalizar" a linguagem e mandar bala. Os caras querem tudo pronto, ô gente preguiçosa. Mas é preguiça mental, de pensar, de analisar o que os rodeia, ficcional ou real.


 A verdade é que esta crise é geral. Jornalistas estão falando a mesma coisa, comunicadores reclamam. Todo mundo quer o nenê, mas ninguém quer ficar grávido.


Um dos melhores exemplos que tenho visto é o do Call of Duty, hoje estou jogando o Black Ops. 
Ah, é um joguinho de guerra, a ideia é dar tiro, matar todo mundo, sangue para todo o lado.


Mas há jeitos e jeitos que criar uma história, né? A do Black Ops é genial: O personagem principal acorda amarrado num local cheio de televisores, e num vidro ao fundo estão as silhuetas dos inquisidores. Enquanto o personagem é torturado ele começa a se lembrar das situações que os torturadores querem informações. E cada lembrança é uma fase do jogo. 


Paralelamente a isto as informações vão sendo obtidas nas fases, e você começa a entender o que os torturadores querem saber de você, que não se lembrava de nada no começo.


O Estado da Arte para mim aconteceu numa fase em que um dos personagens da história (seu amigo e que te salva de várias roubadas) senta na sua frente, olho no olho, e começa a contar a vida do pai dele. O jogo pára por vários minutos, close no rosto do personagem, e ele fala sobre a história do pai e da relação deles. E aí o personagem ganha uma nova dimensão, se torna mais complexo, e sua afinidade por ele evolui para algo completamente novo. Espetacular.


Mas acho que os comunicadores e publicitários provavelmente pulam estas fases, né? Uma pena para eles...

8.5.12

A emoção no meio do caminho

As emoções estarem no meio do caminho de nossas decisões têm seu lado bom e seu lado ruim. António Damasio já analisou em "O Erro de Descartes" o papel delas e é bem claro que se elas não estivessem atuantes nas decisões ficaríamos avaliando prós e contras infinitamente até na hora de comprar pasta de dente.
Mas percebo que existem algumas questões curiosas sobre o tema. Quando digo "percebo" é que vejo algumas dilatações e desvios que a emoção gera nas pessoas em praticamente todas as pessoas.


Um exemplo?
Uma pessoa que tem de tomar uma decisão e mudar comportamentos e hábitos para atingir algum objetivo. Pode ser desde um adolescente que precisa estudar para a prova até um sedentário que precisa fazer ginástica.
Há evidentemente uma complexa mudança de ritmo e orientação para novos hábitos, não se pode esperar que você troque de mão a escova de dente e saia escovando como se fosse a coisa mais simples do mundo, que não é.


Mas há outra questão, que é o que me interessa nesta reflexão: É muito comum que mudanças comportamentais não sejam tomadas pelo simples fato de estarmos ocupados pensando nelas, como se pensar (pensar neste contexto significa sentir de maneira introspectiva, vivenciando emoções de maneira intensa)  gerasse os resultados e mudasse algo. Paramos no meio do caminho (no caso, nas emoções que a mudança poderia gerar ou na gestação da mudança) e não mudamos. E nesse intervalo que surge a culpa cristã, a autopiedade, a excessiva autocrítica. É no não mudar, na imobilização emocional gerada pelo excesso de sentimentos.


Assim, o adolescente se perde nos devaneios emocionais de ter de mudar e acaba dedicando mais tempo a isto do que resolver sacar o livro da mochila e estudar. O sedentário acorda com sentimento de culpa de não fazer exercício e se dedica mais a se sentir culpado do que amarrar um tênis e sair caminhando pelo bairro.
Este lapso, este intervalo emocional superdimensionado acaba imobilizando a situação de tomada de decisão. O que aumenta a vivência do sentimento gerando angústia e sem gerar a mudança necessária.
Se o excesso de razão gera a imobilidade, o excesso de emoção também.